Sobrenome Madrasta
O assunto relacionado
a inclusão do sobrenome proveniente da relação socioafetiva entre madrasta ou
padrasto e enteado é uma temática que repercute abundantemente no meio jurídico
e social, tendo em vista que se trata de uma questão polêmica, não obstante,
foi necessária a edição da Lei nº 11.924 de 2009 mais conhecida como “Lei
Clodovil” para pacificar a matéria.
A Lei 11.294 de 2009
traz uma nova perspectiva civil-constitucional a respeito da paternidade e
maternidade socioafetiva, pois reconhece a relação de socioafetividade como
suficiente para compor a maternidade ou paternidade no sistema jurídico pátrio
em razão da evolução da compreensão do Direito de Família.
O mens legis
relacionado à criação da Lei 11.924 de 2009 foi pautado, sobretudo, na dignidade
da pessoa humana de forma que passou a reconhecer uma nova modalidade de
paternidade e maternidade, fundamentalmente pertinente a relação de afeto entre
madrasta ou padrasto e o enteado. Dessa forma, a constitucionalização do
direito civil reconhece a parentalidade socioafetiva, materializando a
dignidade da pessoa humana, princípio este norteador da Constituição Federal de
1988.
Modificação
da Lei 6.015 de 1973 (Lei de Registros Públicos)
A lei nº 11.924 de
2009 somada a aplicação de uma nova interpretação constitucional em âmbito
Direito Civil, trouxe inovações em relação a compreensão de família,
preponderando o vínculo afetivo dentro das relações familiares, tornando assim
possível o enteado adotar em sua certidão de nascimento o sobrenome da madrasta ou
do padrasto, compreendendo-se, neste parâmetro, o estado de posse de filho.
Segundo preconiza o
artigo 1º da lei em estudo “Art. 1o Esta Lei modifica a Lei no 6.015,
de 31 de dezembro de 1973 – Lei de Registros Públicos, para autorizar o enteado
ou a enteada a adotar o nome de família do padrasto ou da madrasta, em todo o
território nacional.”
A modificação da Lei
de Registros Públicos ocorreu em relação ao seu artigo 57, que passou a vigorar
acrescido do § 8o,
com a seguinte redação: “O enteado ou a enteada, havendo motivo ponderável e na
forma dos §§ 2o e 7o deste artigo, poderá requerer ao juiz competente
que, no registro de nascimento, seja averbado o nome de família de seu padrasto
ou de sua madrasta, desde que haja expressa concordância destes, sem prejuízo
de seus apelidos de família.” Dentro da compreensão de nome, cabe salientar,
também está incluso o nome de família, que seria o sobrenome propriamente dito.
Maternidade
socioafetiva
Fundamenta-se a
maternidade socioafetiva na convivência familiar duradoura, não influenciando
quanto a origem do filho. Com a evolução da compreensão do Direito de família,
a família se tornou cada vez mais plural, os núcleos familiares foram além dos
tradicionais, obrigando o ordenamento jurídico a se readaptar com essa nova
realidade.
O artigo 1.593 do
Código Civil esclarece que o parentesco pode derivar dos laços consanguíneos,
da adoção ou de outra origem. Desta feita, a origem da relação socioafetiva
deriva diretamente do afeto, justamente do vínculo afetivo criado entre
madrasta e o enteado. Nessa perspectiva valem mais os vínculos afetivos
alimentados por quem criou do que o vínculo biológico propriamente dito.
Afeto
como fator primordial à inclusão do sobrenome DA madrasta
O nome no Direito
Civil é elencado como um direito personalíssimo, presente no artigo 16 que
assevera que “toda pessoa tem direito ao nome, nele compreendidos o prenome e o
sobrenome". A própria Lei de Registros Públicos em seu artigo 54, § 4º,
aduz que é obrigatório do assento de nascimento o nome e o prenome, que forem
posto à criança, que acompanhará seu portador pelo resto de sua vida.
Percebe-se então que
com o uso do patronímico da madrasta o enteado vem a reconhecer a maternidade,
uma vez que se trata de uma relação afetiva que existe de fato, repercutindo
tanto como uma questão moral quanto uma questão perante a sociedade.
Para tal
reconhecimento, vale ressaltar, não necessariamente precisa que venha a se
prejudicar a relação da criança com os seus genitores, tampouco é necessária a
aprovação deles para tal. Essa inclusão do patronímico reflete apenas em
relação a afinidade de madrasta com o enteado, mantendo-se os demais nomes de
família inerentes a relação com os seus genitores.
Pressupostos
Legais
Inicia-se com a
requisição judicial, pois a inclusão do sobrenome da madrasta só se dá mediante
a autorização judicial através de um processo. A Vara competente é a de
Registro Público, e cabe ao juiz, ao analisar o caso em concreto, baseando-se
nos ditames da nova compreensão dada ao Direito de Família, aprovar ou não a
alteração do nome.
Deve haver o
consentimento da madrasta, uma vez que seu patronímico só será utilizado no
nome do enteado se houver expressamente a sua concordância para tal ato. Deve
também se observar a manutenção dos demais apelidos de família, pois não pode
haver prejuízo a terceiros com essa nova inclusão, vigorando apenas o
acréscimo.
É dado o prazo de
cinco anos para que possa ser incluso o sobrenome do padrasto ou da madrasta,
sem esse vínculo anterior de cinco anos torna-se inviável a requisição da
inclusão do sobrenome da madrasta. E, por último, deve ser apresentado motivo
ponderável, sendo esse requisito de ordem subjetiva, através da compreensão do
magistrado ao analisar o caso em concreto, com a prova de afinidade e a
demonstração da boa convivência e do relacionamento afetivo entre madrasta e o
enteado.
Posicionamento
dos Tribunais
Em Apelação Cível
(nº70075548818) a Oitava Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do
Sul entendeu por manter a sentença que julgou como procedente a inclusão do
sobrenome do padrasto no registro civil de uma criança.
Após a mãe da criança
que o representou judicialmente ingressar com uma ação pedindo a inclusão do
sobrenome do padrasto em seu registro, o pai biológico da criança recorreu da
decisão na Vara dos Registros Públicos da Comarca de Porto Alegre alegando que
o filho, pela “tenra idade”, ainda não possuía discernimento o
suficiente para fazer tal pedido. Ele ainda alegou alienação parental.
O egrégio Tribunal
entendeu por negar a legitimidade do pai biológico de figurar no processo, já
que o que era discutido no processo não era a exclusão do seu patronímico no
nome da criança, mas apenas o acréscimo do sobrenome do padrasto, pretensão essa
embasada no artigo 57 da Lei 6.015 de 1973 (Lei de Registros Públicos), que foi
modificado pela Lei 11.924 de 2009.
No caso em tela,
prevaleceu o melhor interesse da criança e do adolescente que também influencia
na possibilidade desse registro. Bem como, influenciou o direito de
personalidade envolvendo o nome do filho, direito este que é reconhecido um
alongamento da compreensão da dignidade e reflete o direito ao nome, sobretudo,
um nome que se adeque a realidade e estruturação completa.
Deve-se compreender que mesmo havendo o pai e mãe biológico,
os Tribunais também devem observar que há uma mãe afetiva que figura nessa
função de mãe com a criação desse filho. Logo há substrato fático que permitem
a aplicação legal que viabilizam a inclusão do sobrenome da madrasta.